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Parece que um blog que se propõe a falar de livros e autores independentes não pode deixar de fazer referência a uma das personalidades mais marcantes e controvertidas da literatura do século XX. A realidade é que até hoje havia passado em branco por aqui. Pobre deste blog.
  Sylvia Beach, em seu livro, conta que o casal Pound foi um dos primeiros frequentadores de sua famosa livraria em Paris, lá pelos anos 20 do século passado. Ezra Pound e Dorothy Shakespear (sem o "e", ela fez questão de frisar) moravam em Londres nesta época. Ele americano e ela inglesa. Dorothy chegou a fazer um mapa para ser impresso no verso do anúncio da livraria, porque achou que seria muito difícil aos possíveis leitores a encontrarem. Ezra Pound é considerado um dos precursores do modernismo na poesia. Revolucionou tudo. E ainda por cima deu sugestões, acatadas, no famoso poema The Waste Land de T.S. Eliot. Incentivou, não apenas com palavras, mas até com apoio financeiro escritores de talento como James Joyce e Ernest Hemingway.
  Publicou seu primeiro livro, cuja tiragem foi de apenas 100 exemplares, quando morava na Itália. Mas sua obra prima foi o longo e complexo poema Os Cantos, que durou cerca de 40 anos para ser totalmente terminado. Vou dizer uma coisa para vocês. Não é de fácil leitura. É preciso pesquisar um pouco para captar exatamente o sentido dos Cantos, uma proposta de poema épico, que começa buscando inspiração na Odisseia de Homero e na Divina Comédia de Dante. Ele mudou totalmente a métrica tradicional, incluiu partes de poemas de outros poetas, buscou trechos da filosofia chinesa, citou acontecimentos históricos, fez, em resumo, um apanhado da cultura universal.
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   Ele mesmo escreveu um dia que os maus críticos falam do poeta, e os bons da poesia. Mas não posso deixar de falar do poeta. Ezra Pound teve uma vida complicada. Depois de morar em Londres e em Paris ele se estabeleceu na Itália. Além de uma personalidade rebelde, e um poeta reconhecido, ele também tinha ideias econômicas. Achava que o capitalismo tal como existia na primeira metade do século XX era um desastre. E começou a gostar das ideias de Mussolini, chegando até a pessoalmente ofertar-lhe um livro seu com dedicatória, que dizem o Duce nem se deu ao trabalho de folhear. Quando começou a Segunda Guerra Mundial ele preferiu ficar na Itália, e foi convidado para fazer um programa radiofônico. A ideia era falar de poesia e literatura, mas parece que ele acabou fazendo uma certa propaganda do fascismo. Até aí nada, se não fosse também os ataques ao presidente Roosevelt e aos capitalistas em geral, inclusive judeus. Quando acabou a Guerra os americanos o prenderam a caminho de casa, em Veneza. Foi enjaulado, dizem que por engano, mas isso o levou depois de algum tempo naquela situação a um ataque nervoso. Então, foi transferido para um hospital psiquiátrico em Washington e lá ficou, sem sair, mais de dez anos. Neste período preso na Itália escreveu os chamados Cantos Pisanos (os de número LXXIV até LXXXIV). É sempre citado nas antologias o Canto LXXXI, uma espécie de reflexão sobre sua própria vida, se entendi bem. Um pequeno trecho a seguir, na tradução de José Lino Grünewald.

Quão míseros teus ódios
Criados na falsidade,
Põe abaixo tua vaidade,
Precoce em destruir, mesquinho em caridade,
Põe abaixo tua vaidade
Digo põe abaixo.

A interferência de vários intelectuais e amigos, como Hemingway, acabou por resultar em sua libertação, e o retorno para a Itália, onde veio a morrer em 1972. Contam que ao descer do navio, em Veneza, fez a saudação fascista. Continuava contestador.
(25 de janeiro de 2018)

Carlos G. Vieira

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